Pesquisas mostram que a exposição repetida a uma frase como "A temperatura corporal de um galinha" e mesmo que nenhuma informação relevante seja dita sobre a temperatura de uma galinha, é mais propenso a julgar esta afirmação como verdadeira. Mas esta descoberta evidencia um importante aspecto da psicologia, e tem um importante papel em como vemos o mundo. As coisas às quais existe uma maior exposição parecem mais verdadeiras. Agora, a forma como isto funciona parece ser por um mecanismo chamado “Cognitive Ease (Facilidade cognitiva)".
Facilidade cognitiva é uma medida que identifica o grau de "trabalho" a que o cérebro está sujeito. De "fácil" como navegar nas redes sociais, de "difícil" como tentar multiplicar 14x37. Coisas que são verdadeiras geralmente provocam facilidade cognitiva, como o fogo é quente, a Terra gira em torno do Sol, cães têm quatro patas e por aí em diante. Estas afirmações não apenas parecem verdadeiras, mas também familiares, fáceis e certas. Tudo isto é resultado da facilidade cognitiva.
O problema surge porque a facilidade cognitiva pode ser criada artificialmente de outras formas. Uma das formas é simplesmente repetir o estímulo. Num estudo feito em duas Universidades de Michigan, os investigadores colocaram anúncios nos jornais das universidades, cada anúncio contendo apenas algumas palavras sem sentido. Estas foram impressas com frequências diferentes. Uma palavra apareceu no jornal apenas uma vez, enquanto que outras apareciam 2, 5, 10 ou 25 vezes. A frequência das palavras foi invertida na outra universidade. No final da prova de conceito, mandaram questionários para que as pessoas avaliassem o significado de cada uma destas palavras sem sentido numa escala entre significa algo bom e significa algo mau. Os resultados foram claros, quanto mais frequentemente uma palavra aparecia no jornal, mais as pessoas sentiam que significava algo bom.
Então com repetição suficiente, mesmo uma palavra sem sentido acaba por se tornar familiar o que ativa a facilidade cognitiva e sentimentos bons no geral. Estudos mostram que isso também funciona com caracteres chineses ou até formas aleatórias e as conclusões são ainda mais extensas do que isto. Músicas são julgadas mais favoravelmente após serem ouvidas várias vezes, do que quando ouvidas pela primeira vez.
O que levanta a pergunta "O porquê de algumas pessoas serem famosas?" Dependendo de para quem a pergunta é feita, pode-se achar que elas são famosas por nada ou são famosas por serem famosas. Mas na realidade elas são famosas pela mesma razão que qualquer pessoa é famosa e isto é porque as caras e os nomes delas são vistos e ouvidos várias e várias vezes. Estas pessoas tornam-se familiares e portanto são processadas com facilidade cognitiva, o que também faz com que seja bom vê-las e saber sobre elas. Este é o núcleo da indústria da propaganda. A ideia é que se repetida o suficiente, até a água castanha gaseificada com açúcar parece deliciosa. Mas talvez não seja surpresa que estímulos repetitivos são percebidos de forma mais favorável pelo cérebro.
No final de contas o cérebro evoluiu para identificar ameaças e qualquer coisa nova é uma ameaça com potencial, mas se, depois de exposto repetidas vezes e nada de mau acontecer, torna-se familiar, confortável e portanto um sinal de segurança ao invés de uma ameaça. Este fenômeno estende-se para além dos humanos. Galinhas que ouvem um tom quando estão no ovo, mais tarde manifestaram menos stress ao ouvirem o tom quando são mais crescidas.
Contudo a repetição não é a única forma de criar facilidade cognitiva. Imagens com alto contraste são percebidas pelo cérebro com mais facilidade cognitiva, fazendo com que pareçam boas. O que explica a maioria dos filtros do Instagram. Em um outro estudo, pessoas que viram imagens em que o contorno aparecia rapidamente e de forma imperceptível antes da imagem, elas começaram a sorrir e a relaxarem as suas sobrancelhas, este relaxamento foi medido pelos eletrodos que estavam nesses músculos. Vídeos com baixa qualidade de som e baixo contraste, causam tensão cognitiva enquanto se tenta descobrir o que está acontecer, possivelmente a tentar encontrar ameaças. Por isso é que vídeos com alto contraste e áudio nítido são preferíveis. E o mesmo se aplica a textos. Estudos mostram que na maioria das vezes a escolha vai cair na resposta mais legível, textos em negrito com alto contraste são mais fáceis e rápidos de ler o que faz com que sejam interpretados com maior facilidade cognitiva e portanto parecem mais verdadeiros
Advogados com sobrenomes fáceis de pronunciar são vistos com mais frequência em altos cargos na hierarquia dos escritórios de advocacia, chegando a depender da raridade e da etnia dos nomes. Até empresas que têm abreviações pronunciáveis na bolsa de valores tiveram uma performance melhor do que aquelas com abreviações impronunciáveis (atenção, isto não é uma dica). E estar feliz, na verdade torna o humano mais propenso a experienciar facilidade cognitiva e por sua vez mais intuitivo também.
O simples exercício de tentar encontrar uma conexão neste conjunto de três palavras: “Céu, Lâmpada, Brilho” mostra que pessoas podem determinar se há uma conexão ou não em apenas alguns segundos. Já agora a resposta ao exercício é “Luz”. Agora nem todo o conjunto de 3 palavras define uma conexão, mas é incrível a nossa capacidade de associar estas palavras a uma só num curto espaço de tempo. Isso deve-se à sensação de facilidade cognitiva, em algum lugar dentro do cérebro estas associações causam um lampejo de reconhecimento, o que passa uma sensação boa e é por essa razão que as pessoas dizem para usar a intuição numa prova de escolha múltipla se não houver certeza da resposta certa.
Agora isto é verdadeiro ou falso?
"Todas as rosas são flores."
"Algumas flores desbotam rápido."
"Portanto algumas rosas desbotam rápido."
A resposta é: Falso
Rosas não fazem parte do grupo de flores que desbotam rápido. Um estudo que usou um conjunto similar de três perguntas concluiu que 90% das pessoas cometeram pelo menos um erro quando as perguntas foram impressas de forma clara, mas quando o teste foi impresso de uma forma inevidente, a taxa de erro caiu para 35%. Tornar o teste difícil de ler na verdade aumentou os resultados dos testes. Isto acontece porque um teste ilegível gera tensão cognitiva, forçando o cérebro a trabalhar mais e isto ajuda a evitar o erro da resposta intuitiva.
Facilidade cognitiva é útil para ser criativo e intuitivo mas também têm a consequência de tornar o humano mais ingênuo. Na parte escrita do exame de condução, usar a intuição é provavelmente uma boa estratégia, mas em áreas como a física, onde as respostas são contra-intuitivas e há muitos equívocos, é importante ser mais cético. Esta atenção requer esforço, e também está associada com a infelicidade. Alguns dos melhores cientistas e mentes analíticas de sempre são mal humorados e desconfiados de tudo, e isto pode ser mais do que falta de habilidades sociais, pode ser algo essencial para que eles façam melhor o seu trabalho e isto é um paradoxo de aprendizagem e pensamento crítico. Eu exploro este tema com mais profundidade neste artigo https://bit.ly/3DB2jS0
Facilidade cognitiva é agradável, fácil, familiar e realmente torna o humano mais criativo e intuitivo mas também pode enganá-lo, pode fazer coisas parecerem verdadeiras quando não o são e pode-se sentir que se está a aprender quando na verdade não o está. Por outro lado, ser cético e analítico requer mais esforço mental e é mais confuso e menos prazeroso, mas é a melhor forma de separar os factos da ficção.
Agora pode-se pensar que o objetivo deste artigo é dizer que devemos pensar criticamente com mais frequência, mas não é isso, como um pensador analítico eu demoro “meia hora” só para fazer uma escolha trivial do dia-a-dia como qual pasta dos dentes comprar, por isso definitivamente há momentos em que facilidade cognitiva é o estado mental mais apropriado, ou seja, desenvolvemos esta capacidade por algum motivo, para poder reagir de forma intuitiva em situações familiares do dia-a-dia.
Conclui-se que a chave é identificar aqueles momentos onde pensar um pouco mais é necessário, mas com a partilha e a repetição de ideias mais fácil do que nunca, a atenção tem que ser maior para poder distinguir o que realmente é verdade e o que simplesmente se escuta várias vezes e sabemos que quanto mais algo é repetido, mais começa a parecer verdade.